Corpo, vida, medo e recuperação



Somente quem já passou pelo fio da navalha e se deitou em uma mesa cirúrgica, sabe o que é aquele frio gélido que percorre a espinha e nos deixa completamente atônitos diante da possibilidade de apagar com uma anestesia e não voltar, acordando sabe-se Deus onde!

Acordar de uma anestesia geral. Falar bobagens inimagináveis diante de amigos e familiares que estão ali para recebê-lo depois de horas de nervosismo. Acordar completamente grogue e declarar amor ao cachorro da amiga, por exemplo, é uma das coisas que se faz quando o seu inconsciente está liberado.
Preocupações diversas, que geralmente estão nos escaninhos da mente, saem e dão uma volta bem à vontade nas falas da consciência.

Mas a experiência que mais me aterroriza, quando sofro intervenções cirúrgicas, e já sofri algumas nessa vida, é aquela em que eu não sou dona do meu corpo. Quando eu sei que quero fazer algo e ele simplesmente não responde, porque se encontra limitado, mesmo que momentaneamente. O medo durante a recuperação é normal e acredito que por mais que a pessoa seja otimista, há aquele momento em que ela pára consigo mesma e sente aquele temor profundo de que nada vai ser como antes.

Ah!!!!! Como eu gosto do meu corpo. Como eu o respeito, como eu o admiro. E como eu posso, por vezes, esquecer disso? Como eu posso negligenciá-lo em nome de comidas que só satisfazem a minha gula? Como eu posso dormir mal e colocá-lo no limite? Como eu posso me aborrecer e estressá-lo com coisas que são absolutamente supérfluas? Como eu posso tratá-lo tão mal com situações sem quaisquer benefícios?

Sim. A gente apenas entende e dar valor quando percebe que algo não vai bem, quando fica limitado, quando não é mais "dono" do seu próprio corpo, quando anda devagar, curvado para frente com medo de se esticar, quando sente todos os pontos dados, quando a pele arde, quando o seu organismo reage à anestesia e a dor de cabeça que se sente é insuportável, quando se come algo e de repente sem se controlar a diarréia vem e você se sente mais fraco do que já estava antes, quando você é obrigado a comer tudo aquilo que você não gosta, quando o sabor das coisas não têm o mesmo sabor de antes...

Enfim, tudo isso é apenas uma ínfima parte do que acontece com você, quando a cirurgia é feita de profilaxia. Imagina quando se opera de urgência e de emergência? Porque esperar a merda feder?
Perguntas que se faz, respostas que não se têm, por mais inteligente que seja.

Qual é o problema disso tudo?
O problema disso tudo é que tudo passa e quando passar, a vida voltar ao normal, a gente faça as mesmas tolices e idiotices, porque há quem tenha memória fraca e esquece rápido.

Então, me propus nesse tempo de "férias forçadas", a ser mais light comigo mesma, a me estressar menos, a tentar ter uma qualidade de vida decente, dormir mais, acordar cedo, me preocupar com o que deve ser preocupante de fato, comer de forma saudável, rir mais, fazer amizades, olhar no horizonte e ver que além do mar, há de fato um pote de ouro com uma plaquinha dizendo: 
VIVA E SEJA FELIZ!

P.s. Minha recuperação? Vou bem obrigada!


Comentários

  1. Que delicia de texto! É bem isso mesmo: perder os controles todos para tornar a tê-los de fato. Ou nao. Saude! Bom humor é sempre boa cia.

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